terça-feira, 1 de junho de 2021

Recital de Poesias do Dia das Mães

Recital de poesias feito pela família Leite no dia 09/05/2021, para poder comemorar o Dia das Mães, em um ano onde as comemorações estão extremamente restritas, e a poesia e a arte se fazem mais necessárias que nunca.


 

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Joaquina Lacerda entrevista Ubirajara Brito

 

Trata-se da gravação de uma entrevista-conversa realizada em 2011, onde Joaquina Lacerda Leite entrevista seu conterrâneo Ubirajara Brito, o mais famoso intelectual tremedalense que, após perambular pela UFBA, onde estudou Engenharia e foi professor, pela França (onde fez doutorado em Engenharia Nuclear), pela chefia de Gabinete do Ministério da Educação, Gestão Carlos Santana (Governo Sarney), pela coordenação do Programa CAPES-COFECUB, refugiou-se em Vitória da Conquista (onde foi Coordenador Acadêmico do centro universitário FAINOR), para ficar mais perto de sua raiz tremedalense. A conversa revela um Bira eminentemente historiador, com uma memória excepcional sobre a história dos fundadores de Tremedal.

 

Parte 1:




Parte 2



Parte 3:



Parte 4


terça-feira, 5 de abril de 2016

“O golpe vai ser dos pretos contra o racismo, contra as elites, não o contrário”

Encontro de estudantes da Uneafro contou com a presença do ator Lázaro Ramos

Por Pedro Borges Do Alma Preta

Mais de 600 jovens se reuniram no Céu Jambeiro, Guaianazes, zona leste de São Paulo, para participar da atividade organizada pela Uneafro, “Por uma Democracia de Verdade”. O evento tinha o intuito de discutir a conjuntura atual e o papel político da juventude negra.

A programação contou com uma série de atividades, desde apresentações musicais, roda de capoeira, sarau, conversa com as Mães de Maio e o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, MTST, até a participação especial de Lázaro Ramos.

Sobre o evento, o ator pensa que “é importantíssimo conversar com a juventude, entender o que eles estão pensando, sentindo, quais são as novas propostas de mundo que eles trazem. Para mim, mais importante do que falar aqui, foi escutar”.

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Ator Lázaro Ramos se emociona ao falar sobre o genocídio da juventude negra
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Douglas Belchior, militante da Uneafro e um dos organizadores da atividade, explica que o debate serviu para conversar sobre o momento político vivido pelo país. Foi posta a necessidade de se opor ao golpe articulado pela direita, assim como criticar as decisões tomadas pelo governo do Partido dos Trabalhadores. “Infelizmente a gente não tem visto isso desse governo, que tem adotado a pauta da direita, a pauta dos inimigos. O golpe vai ser dos pretos contra os racistas, contra as elites, não o contrário. Os trabalhadores, as periferias, negros e negras, os LGBTs, todo esse povo que sofreu a margem tem que se organizar e promover um golpe contra a direita reacionária e racista”.


O trabalho do cursinho popular de formação permanente dos jovens de periferia foi destacado por todos que participaram do encontro, algo que parte da esquerda brasileira abandonou no último período, de acordo com Douglas. “Nosso trabalho é para que os jovens de periferia entrem na universidade e se mantenham periféricos, se mantenham negros. Que mudem a universidade e a tornem o que ela deveria ser por natureza, um lugar diverso, que coloque a sua estrutura para mudar a sociedade e não manter a estrutura”.

A Uneafro tem 42 núcleos espalhados pelo país, com a sua grande maioria localizado na Grande São Paulo. Destes, mais de 30 deles estiveram presentes na atividade de sábado. Sobre isso, Carol Fonseca, militante da organização, enaltece a oportunidade de conhecer melhor todos que fazem parte da organização. “Foi um espaço onde eu tive a oportunidade de olhar para cada pessoa que faz parte desse movimento, de ouvir, de abraçar, de expor aquilo que penso e de ver que não sou só eu, Carol, jovem negra e periférica, que acredita numa nova organização de sociedade”.

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Gabriela Martins, estudante da Uneafro do núcleo Rosa Parks em São Matheus, reforçou o papel da formação de base e de momentos de união e troca de saberes entre a juventude negra. “Foi bacana, porque foi uma formação de base. Tem os núcleos e neles a gente já faz alguns debates nas formações, mas eu acredito que quando junta todo mundo, o pessoal acaba se conhecendo para fazer uma formação mais completa”.

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Genocídio

Lázaro Ramos enfatizou o seu encanto com o posicionamento da juventude negra e dos movimentos autônomos de periferia. Ele acredita que a entrada na universidade e a vontade de falar por si têm construído momentos únicos, protagonizados por esse grupo social. “Quanto mais o tempo passa, mais as vozes tentam buscar o seu microfone para serem escutadas. E a periferia tem sido responsável por um movimento que me encanta muito. Quando eu vejo o movimento gay, o movimento negro, os movimentos sociais e com novo depoimento”.

O seu grande porém a ser evidenciado foi o genocídio da juventude negra. De acordo com o Mapa da Violência 2015 – Mortes Matadas por Armas de Fogo, 5.058 jovens brancos e 17.120 jovens negros foram assinados por armas de fogo no país. Para ele, “a gente regride é na quantidade de assassinatos que tem acontecido com jovens de periferia. Isso é uma coisa que a gente tem que falar e denunciar o tempo todo. Esse é o grande pesar desse momento. Essa é a grande bandeira que a gente tem que levantar, manter o jovem negro vivo, manter o jovem da periferia vivo, porque o futuro está aí e eles têm muito a contribuir com o Brasil”.

O encontro foi construído desde o início de 2016 e contou com o apoio da Secretaria de Educação da cidade de São Paulo, do Céu Jambeiro e da Secretaria Municipal de Igualdade Racial, SMPIR-SP.

Confira na íntegra a entrevista com Lázaro Ramos:

Fonte: Geledés

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Empoderamento feminino: o inspirador discurso de Michelle Obama na Argentina

Em seu discurso perante um auditório de jovens mulheres no Centro Metropolitano de Design, nesta quarta-feira (23), na Argentina, a primeira-dama dos EUA, Michelle Obama, emocionou a todos ao falar sobre a importância das mulheres derrubarem os preconceitos sexistas – que as colocam em segundo plano – e a conquistarem seus lugares no mundo.


Por Claudia Do Brasil Post

“Precisamos de mais líderes mulheres nas empresas e que criem suas próprias empresas. Líderes mulheres nos laboratórios fazendo novas descobertas que derrubem o mito de que a ciência e a matemática são coisas de homem”.

Ela relembrou, ainda, sua infância na periferia de Chicago:

“A educação foi tudo para mim. Graças aos estudos, tive oportunidades que meus pais nunca tiveram”, disse. Michelle contou que na sua adolescência “sonhava com ir à melhor universidade e ser advogada, ter um trabalho importante e ser líder na comunidade”.

Mas a vida nem sempre foi fácil para ela.

“Quando comecei a estudar, teve gente que não acreditava na minha capacidade. Dizia que eu não ia conseguir alcançar meus sonhos. Tive até professores que achavam que eu não era inteligente o suficiente e apoiavam apenas os meninos da sala. Sentia que por ser garota, minha voz tinha menos importância do que a minha aparência, do que meu corpo”, contou ela, que é graduada em Direito pela Universidade Harvard.

“Conforme fui ficando mais velha, encontrei homens que, na rua, só julgavam o meu corpo, como se eu fosse um objeto, uma propriedade – em vez de um ser humano com sentimentos”.

Ela admitiu que muitas vezes se questionou, se sentia triste diante a tanta pressão, mas que sabia que não podia fraquejar.

“Decide, então, não ouvir as vozes que me menosprezavam. Decidi ouvir minha própria voz e as dos que acreditavam em mim”.

Michelle terminou seu discurso encorajando as meninas da platéia:
“Desejo o mesmo para vocês. Insisto para que tenham a melhor educação que puderem. Não deixem que as subestimem”.

A conversa faz parte do programa “Let the Girls Learn” (“Deixem as meninas aprenderem”), lançado por Washington há um ano.

A primeira-dama também lançou recentemente uma mobilização para reunir assinaturas no mundo todo em apoio à educação de meninas que têm esse direito negado.

Com o nome de #62MillionGirls (#62MilhõesdeGarotas, em inglês), a campanha tem o objetivo de apoiar as 62 milhões de meninas pelo mundo que estão fora das escolas, sendo metade delas adolescentes.




Fonte: Geledés

quarta-feira, 23 de março de 2016

A HORA DA XEPA

Por Fernando de Barros e Silva

O governo de Dilma Rousseff parece muito próximo do fim. Depois de quarta-feira, quando Lula foi anunciado ministro e vieram a público os grampos, o país entrou em curto-circuito: o que se viu nas ruas nas 48 horas seguintes não eram mais manifestações com data e hora marcadas, mas focos de revoltas quase permanentes espalhados pelas grandes cidades, com destaque para a vigília que se instalou na avenida Paulista, em frente ao medonho prédio da Fiesp, transformado em quartel general do impeachment. Em Brasília, os manifestantes zanzavam entre o Planalto e o Congresso, entrando várias vezes em confronto com a polícia, o que amplificava a sensação generalizada de que o poder agora estava sitiado. O ódio a Lula e ao PT, que nos protestos do dia 13 havia se manifestado com toda a força retórica, transbordou, fazendo emergir nas ruas a figura doCoxa Bloc – um tipo social que vinha sendo gestado na alma profunda das manifestações “pacíficas e ordeiras”. Na semana passada, houve registros de cenas de agressão física e risco iminente de linchamento de simpatizantes do governo. É algo que tende a se reproduzir daqui para a frente.

As manifestações reativas a favor do governo (emdefesa da democracia, contra o golpe) puderam mostrar, pela primeira vez desde que a crise atingiu seu ponto de ebulição, que o desfecho será mais traumático do que podia sugerir a escalada do “fora Dilma”. Apesar da avalanche de reveses, o PT conseguiu agrupar nas ruas muita gente de suas tradicionais bases (sindicatos, movimentos sociais, classes médias). Ninguém esperava, nem mesmo os organizadores, 100 mil pessoas na mesma Paulista que havia se transformado em passarela do impeachment.

A correlação de forças, de qualquer forma, é amplamente desfavorável ao governo: o Datafolha mostrou neste domingo que 68% dos brasileiros querem o impeachment de Dilma, e a rejeição a Lula atinge espantosos 57%. Os dois, mais do que nunca, estão sitiados.

Uma coisa é certa: o momento atual não tem nada a ver com aquele da queda de Fernando Collor, em 1992. Primeiro, porque desta vez a cisão política na sociedade é profunda e está se acentuando. Collor não tinha partido, não tinha trajetória nem história públicas relevantes, não tinha lastro social. Segundo, porque o Congresso nem de longe exibe a mesma legitimidade – o presidente da Casa não tem autoridade moral para ser síndico da Papuda. Eduardo Cunha é fruto da debilidade política do governo e da conivência de parte expressiva dos meios de comunicação (ele foi, em determinado momento, e não faz tanto tempo, alçado à condição de herói nacional e ocupou, em escala menor, o lugar imaginário que hoje é de Sergio Moro). A sobrevida de Cunha na Presidência da Câmara é fruto, ainda, da cultura do compadrio disseminada no Congresso. No caso dele, o compadrio se desdobrou em gangsterismo: houve aliciamento e intimidação de colegas, mais do que simples troca de favores e instinto de proteção corporativa. E os tucanos são cúmplices desse personagem, réu da Lava Jato, acusado de corrupção e lavagem de dinheiro, com contas comprovadas na Suíça. Cunha é o “culpado útil”.

Em terceiro lugar, o day after de um possível impeachment terá que se defrontar com a instabilidade crônica que a Lava Jato passou a representar para o mundo político, a começar por Michel Temer e a oligarquia do PMDB, sem esquecer, obviamente, o menino do Rio, Aécio Neves. Mais do que isso – e para ir ao fundamental –, o processo atual difere do que ocorreu em 1992 porque aquele foi um momento de afirmação da democracia e avanço do país; agora, tudo indica que estamos vivendo um processo de fragilização da democracia e ameaça de retrocesso institucional, além da regressão social em curso.

Isso posto, o governo Dilma, a rigor, não existe mais. Constrangida pelo próprio PT a entregar a massa falida de seu mandato nas mãos de seu padrinho e tutor político, a criatura abraça o criador como dois náufragos que sucumbem um agarrado ao outro. Com a ida de Lula para a Casa Civil, o Planalto foi transformado em bunker da crise, numa espécie de Palácio da Imunidade. Não há como distinguir entre interesses privados e projeto político nessa cartada desesperada. “Quando a gente não pode fazer nada, a gente avacalha”, dizia o Bandido da Luz Vermelha no filme de Rogério Sganzerla.

A avacalhação, no caso, se estende a Sergio Moro. Em relação a Lula, está óbvio que o juiz não agiu de acordo com o tempo processual, mas segundo a velocidade da notícia. Seu timing foi o da luta política, não o da Justiça. O primeiro grampo a vir a público, no qual Dilma trata com o ex-presidente da assinatura do termo de posse, foi divulgado pela GloboNews na tarde de quarta-feira, pouco depois da entrevista coletiva em que ela negava qualquer intenção de blindar o novo ministro. Era um grampo colhido após o fim da autorização judicial, que no entanto foi anexado ao inquérito e exposto ao país com estardalhaço. Ao perceber que havia perdido o domínio contra seu alvo principal, Moro tomou uma atitude digna dos aloprados. Tem razão Janio de Freitas ao dizer que “a ilegalidade foi ampliada com a divulgação, em meio às gravações, dos telefones particulares e das conversas meramente pessoais, que Moro ouviu e, por lei, devia manter em reserva, como intimidades protegidas pela Constituição.” Transformado em herói nas ruas, ele se fragilizou no episódio como nunca antes na história da Lava Jato.

Há muitas coisas em jogo neste momento, e uma delas é justamente o futuro da operação. Passamos a vida repetindo que a impunidade dos ricos e poderosos é um dos vexames do Brasil – “pegar peixe miúdo é fácil, quero ver prender um tubarão.” Aí está. A força-tarefa e Moro empilharam tubarões na carceragem de Curitiba. Depois que o juiz condenou Marcelo Odebrecht a quase vinte anos de prisão, seus pares que ainda não falaram estão retirando senha para entrar na fila da delação. O próprio empresário se inclina a abrir a boca a fim de reduzir sua pena. A mulher de João Santana, Mônica, e talvez o próprio marqueteiro, ambos na cadeia, podem vir a esclarecer em breve qual era a origem, o destino e a razão do dinheiro que receberam da Odebrecht em plena campanha presidencial de 2014.

Nunca se chegou tão longe no desvelamento das relações promíscuas entre os donos do poder e os donos do dinheiro. A discussão sobre as arbitrariedades da polícia, do Ministério Público e do Judiciário não é trivial e precisa ser travada. Basta mencionar o pedido de prisão contra Lula feito pelos três pândegos do MP paulista. Mas não se deve nunca perder de vista a enormidade do que está sendo trazido à tona pela versão local da Operação Mãos Limpas.

Ocorre que a boa nova da faxina pelo alto não representa, por si só, nenhuma garantia de que o país irá se tornar mais decente, em sentido substantivo. Pode muito bem ocorrer o contrário. Sem enfrentar esse paradoxo, impossível entender o que está acontecendo hoje.

Aqui, o que parece muito novo traz um monte de velharias para a ordem do dia. No rastro da Lava Jato e da debacle do ciclo petista, estão sendo destampados antigos preconceitos brasileiros, que nunca deixaram de existir, mas que agora ressurgem com inédito direito de cidadania em praça pública.

A referência ao fantasma de 1964 faz sentido. O momento atual ecoa o passado porque é inequívoco o avanço de um fascismo difuso que emana das ruas. O ódio a Lula e ao PT é a sua face mais evidente. A demonização do “perigo vermelho” é a sua dimensão alucinatória. Esse ódio e essa alucinação vêm acompanhados de um patriotismo tacanho e cafona (“meu coração é verde e amarelo”), do desprezo pelos pobres (“parasitas do Estado, massa de manobra”), do desejo de distinção (“pagamos impostos, carregamos o país nas costas”), da adoração à polícia fardada e do ardor à família, da ojeriza aos políticos e de certo pendor autoritário que se apresentam como um “exemplo de cidadania, ordem e civilidade”, conforme as palavras de um dos líderes do Movimento Vem Pra Rua em artigo na Folha, no dia seguinte à manifestação do dia 13. No mesmo texto, Rogério Chequer decretava o “fim da farra” e exaltava “a disciplina e o respeito às leis” por parte dos manifestantes.

Não se pode, é claro, generalizar. Quem faz questão de se autodenominar “gente de bem” às vezes é, de fato, uma boa pessoa. Mas tome-se, a título ilustrativo, odiscurso apoplético do historiador Marco Antonio Villa, um dos gurus do novo Brasil, durante o grande ato cívico: “Aqui tem brasileiros, aqui nós não temos medo, aqui nós mostramos que o verde- amarelo é a cor da nossa bandeira e será para todo o sempre”. Depois de chamar Lula de “cafajeste”, “desqualificado moral” e “criminoso-mor”, ele prosseguiu, com o microfone em mãos: “Só vai ter democracia no Brasil no dia em que Lula for preso, processado e condenado a regime fechado”; “ele não pode estar solto, ele ameaça as instituições e quer a guerra civil.”

Eu estava na Paulista no dia 13. Quis sentir de perto o humor dos meus compatriotas. Vi famílias, crianças e marmanjos posando felizes para selfies ao lado de policiais da Tropa de Choque, com blindados ao fundo. Vi a multidão contracenar com o helicóptero da Polícia Militar, estendendo os braços para o alto e chacoalhando as mãos a cada voo rasante sobre a avenida. Ouvi gritos de guerra contra o criador (“Lula cachaceiro, devolve o meu dinheiro!”) e contra a criatura (“Ei, Dilma, vai tomar no cu!”). Andei uns quarteirões ao lado de pessoas pacatas, gente obviamente despolitizada, entre perdida e deslumbrada com o fato de participar de um ato “a favor do Brasil”. Saí de lá com a sensação de que os petistas ainda vão ter saudades dos tucanos. À noite, conversando com um amigo, ouvi dele o seguinte: “Vai sair muito barato se essa fúria conservadora cair no colo da Marina em 2018.”

sexta-feira, 18 de março de 2016

DIREITA BRASILEIRA NÃO QUER PERDER SEUS PRIVILÉGIOS, DIZ MUJICA

ENRIQUE CASTRO-MENDIVIL: Uruguay's President Jose Mujica arrives to the summit of the Union of South American Nations (UNASUR) in Lima, November 30, 2012. REUTERS/Enrique Castro-Mendivil (PERU - Tags: POLITICS)

terça-feira, 15 de março de 2016

“Todo preconceituoso é covarde. O ofendido precisa compreender isso”, Mario Sergio Cortella

Violência urbana, desconfiança no outro, terrorismo. As ameaças do cotidiano que minam nossas forças são o tema desta conversa com o filósofo Mario Sergio Cortella. E ele sugere como agir diante das aflições sem perder a alegria de viver.



filósofo e doutor em educação Mario Sergio Cortella, 61 anos, começa a entrevista dizendo: “Hoje, o Boko Haram matou cem pessoas no norte de Camarões… Todo dia há notícias assim”. O grupo fanático que ele menciona tenta fazer da Nigéria, vizinha de Camarões, uma república islâmica. E usa a barbárie para suplantar a marginalização política, econômica e social a que fora relegado pelos últimos governos. Essa facção sanguinária se tornou conhecida do público ao sequestrar 200 meninas nigerianas numa escola, em 2014. Muitas foram estupradas. Disputam o noticiário, as degolas de civis por outro bando de radicais, o Estado Islâmico e, ainda, os rescaldos do atentado ao semanário francês Charlie Hebdo, com a rejeição generalizada aos que professam o islamismo, a religião maometana que não prega o ódio muito menos a matança.

Dialogamos com o mestre que fez carreira na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo sobre esses eventos mundiais e sobre os problemas locais que causam angústia. Entre eles, a escassez de água e a falta de luz em São Paulo e outros estados, as balas perdidas no Rio de Janeiro – que, só no primeiro mês deste ano, fizeram 30 vítimas. Em um rápido olhar sobre o quadro atual, nota-se um mundo mais rabugento, intolerante, racista e dando mostras de falência de recursos naturais. Assim, a conversa é sobre nossa impotência diante dos fatos que nos oprimem e deixam a sensação de que não podemos fazer nada para mudá-los. “Mas não é para ficar deprimido com as coisas que nos perturbam”, provoca o paranaense em seu escritório, na capital paulista. “É preciso lembrar que todas essas coisas são criações nossas, da humanidade. E devemos refletir sobre elas se quisermos um futuro mais equilibrado e saudável.” Cortella lança neste mês Educação, Convivência e Ética: Audácia e Esperança! (Cortez), livro que, como suas palavras aqui, ajuda na travessia destes tempos difíceis.

Como o seu livro entra nesse panorama de inquietação e incerteza?
Ele fala em audácia e esperança, sobre a formação de valores e a recusa à fatalidade. Nosso tempo se caracteriza por coisas bem perturbadoras. Uma delas é o tsunami informacional. Há uma torrente cotidiana de eventos, que chegam de diferentes fontes e veículos, e nos preocupam para além das nossas possibilidades de agir. Temos ciência das coisas e nada podemos fazer, o que gera angústia e impotência. Até pouco tempo atrás, uma notícia ruim envolvia somente a sua comunidade imediata. Você ia lá prestar solidariedade ou saciar a curiosidade. Não é mais assim. No entanto, do ponto de vista da violência, é preciso lembrar que o mundo está muito menos violento que no século 20 e em toda história. Dados epidemiológicos e estudos sociais provam isso. O que ocorre é que somos mais notificados hoje, além de haver uma rejeição maior à violência.

Há episódios mais veiculados na mídia, e de uma forma que leva à comoção. O ataque aos chargistas do Charlie Hebdo, na França, impactou mais os brasileiros do que as notícias sobre as polícias militares terem matado 1,7 mil jovens negros no nosso país em 2013 ou sobre 30 feridos por balas perdidas no Rio só em janeiro. Por que a dor do vizinho não nos mobiliza tanto?
Ela me obrigaria a agir e tomar uma decisão ética. Torna-se fácil prestar solidariedade a um movimento social no Sudão ou ficar com pena de uma vítima de explosão no Iraque. É bem mais simples do que lidar com o menino acampado na porta do meu prédio.

Isso exigiria mais do que consciência tranquila por devotar compaixão ao povo do Sudão. Não é?
Exato. A realidade à minha porta me impeliria a uma ação. Não é qualquer adesão meramente virtual. Tem sido comum alguém postar, nas plataformas digitais, um convite para uma passeata. As pessoas dão um like, mas não vão lá. Pensam que participaram. Assim como se sentem engajadas ao assinar um manifesto qualquer ou comprar a camiseta escrita Je Suis Charlie. A transformação de atos em bits, a virtualização das coisas ocupa várias circunstâncias da vida. É importante, mas não resolve tudo. Madre Tereza de Calcutá tem esta frase imbatível, que captura o conteúdo da sua pergunta: “Difícil é amar o próximo. Amar quem está longe é muito fácil”. A ideia do que seja o próximo é complexa. Temos a notícia sobre o que acontece no entorno de casa, mas não nos envolvemos. No fundo, isso também provoca certo desconforto. Embora esse mal-estar não afete a todos. Muitos, neste momento, estão mais preocupados com quem ficará na casa do Big Brother Brasil.

A sensação de desconforto atinge do mesmo modo os jovens e os mais velhos?
A minha geração tinha uma causa: acabar com a opressão. Dos 20 anos aos 30, sob a ditadura, queríamos democracia, liberdade de expressão e de culto, desejávamos escolher os próprios caminhos, uma sexualidade nada amarrada, uma conduta feminina que não fosse secundarizada. A geração atual não vive esses bloqueios nem tem grandes batalhas. A maior das batalhas hoje é a ambiental. Mas não interessa tanto aos novos, porque a minha geração não erotizou a ecologia. Conseguimos erotizar um jeans, um carro, uma balada, uma cerveja… Mas não a causa do meio ambiente. Ela não se tornou um desejo.

Por que a juventude não se preocupa com o fim dos recursos naturais?
Eles deveriam pensar nisso. Mas é uma causa abstrata. Ninguém via o problema da água até poucos meses atrás. Agora temos que tomar providências. A ecologia fala de algo que ao jovem não interessa, que é o futuro. Essa não é uma má geração, ao contrário, tem censo de urgência, é criativa e disponível para uma série de interfaces. Mas vive o dia como se fosse o único. Por quê? Os mais velhos disseram a eles: “Vocês não terão futuro, não haverá emprego, ar puro, segurança”. Os pais também vivem repetindo que os filhos não tiveram infância, não souberam brincar e subir em árvores, como eles. Ora, quem acredita que não tem futuro nem teve passado só enxerga a alternativa de viver o presente até o esgotamento. “Aproveite o dia”, é o lema atual. Grandes causas, como o fim da homofobia e da violência doméstica, demoram. Leva-se tempo para conquistá-las.

Em um bairro paulistano, moradores fizeram refém um funcionário da Eletropaulo. Disseram que ele só sairia dali se a luz voltasse. Em um condomínio, também da capital paulista, moradores andam pondo o ouvido na parede para fiscalizar quanto tempo demora o banho do vizinho, quantas vezes ele dá descarga ou lava a roupa. Isso pode gerar truculência? Acirra os ânimos e cria um clima de desconfiança? Ou é aceitável?
No caso do refém, é um esgotamento de paciência. O usuário diz à empresa, ali representada pelo funcionário: “Não aguento mais ficar no escuro. Não posso ouvir a mensagem gravada informando que o serviço será prestado em seis horas, depois em oito e, mais tarde, em dez horas”. O cidadão já foi enganado demais. A atitude é perfeitamente compreensível, embora possa caracterizar até cárcere privado. Quanto ao controle do banho, penso que a escassez deve se tornar um tema coletivo. Falta de água é grave. Isso é que acirra os ânimos. Num transatlântico, se a terceira classe afundar, a primeira afunda junto. Tomar conta do vizinho é o primeiro passo para organizar uma reação conjunta à falta de água. Se um denuncia o outro por desperdício – e deve haver multa para isso -, não está sendo dedo-duro, mas cuidando do bem de todos. A medida não pode, porém, se tornar uma atividade persecutória, na qual alguém assume uma autoridade que não tem e passa a fazer daquilo uma cruzada. Seria perigoso.

Os autores das ações radicais, no terrorismo, têm entre 20 e 30 anos. Eram crianças no atentado às Torres Gêmeas, em 2001, e, de lá para cá, enfrentaram preconceito e islamofobia. Viram os muçulmanos se tornarem mal recebidos no mundo, com dificuldade de entrar em diferentes países e as mulheres serem proibidas de usar o véu nas escolas. Outro dado: na França, 70% dos presos são muçulmanos. A maioria morava na periferia e, sem estudo e trabalho, cometeu pequenos ou médios delitos. O Estado falhou com eles. Qual é a sua análise sobre as duas coisas?
Não estão presos por serem muçulmanos, e sim porque são estrangeiros pobres, de uma minoria excluída, encostados nas bordas das grandes cidades da Europa. A cadeia deve estar cheia de indígenas, em Dourados (MS); de mexicanos, na fronteira com a Califórnia, nos Estados Unidos; e de sem-terra em áreas de conflito agrário no Brasil. O problema é a exclusão. O jovem muçulmano na França é muito assemelhado ao da periferia das nossas grandes cidades. A arma na mão, no nosso país, é respeito e dinheiro imediato. Na França, é o terror que oferece reconhecimento a esses meninos. Alguns islâmicos entendem o suicídio (caso do homem-bomba) como martírio. Esses jovens se dão importância desse jeito. O propósito dá sentido à vida. De certo modo, eles se ressentem do preconceito no mundo todo, não só na Europa. O véu é problema aqui também. Em Foz do Iguaçu (PR), quem estiver com ele não tira carteira de motorista. A rejeição, porém, não é de natureza religiosa. Uma muçulmana da elite usa o véu onde quiser e é até imitada. Outra coisa é a falta de trabalho para os garotos. Na Arábia Saudita, por exemplo, a economia é restrita ao petróleo, não tem indústria, comércio. Eles vão para o Exército ou cedem ao apelo de psicopatas que recrutam para o terrorismo. Mas eu não tenho uma visão catastrófica do mundo atual. Há muito mais estados com democracia do que antes. Na ausência dela, coloca-se um nível de vitamina mais elevado no terror, caso do Irã e do Iraque, em comparação com a França.

Na democracia, a liberdade de imprensa é imprescindível. Debates após o atentado ao Charlie se deram em torno do limite do direito de expressão. Pode-se ser livre e causar dor no outro?
Não deve haver limite para a liberdade de expressão. E ela não causa dor. Ali ocorreu um excesso de sensibilidade. Quando eu era menino, meu pai dizia: “Se te xingarem na rua e você for aquilo, então não é xingamento, é verdade. E, se você não for, não é contigo”. Logo, se tenho uma religião e alguém tripudia com meus símbolos, não levo em conta. Não tem a ver comigo, mas com quem fez a piada. Pena dele. A grande encrenca do fanatismo é tomar como ofensa a postura do outro. Se quer ser imbecil, seja. Eu não assinaria o Charlie Hebdo. Aquela escatologia não interessa mais. O humor inteligente está na base da recusa ao preconceito. Algo como: “Não ria de mim, ria comigo”.

As pessoas estão agressivas na internet. Ali, há todo tipo de insulto, o que abala os ofendidos. Reagir ao preconceito, dessa forma, não parece tão simples.
Todo preconceituoso é covarde. O ofendido precisa compreender isso. O preconceito tem duas fontes: a covardia e a tolice. O intolerante em relação a etnia, cor da pele, orientação sexual, religião e extrato econômico tem medo de ser o que é. Ele só se eleva quando rebaixa o outro. Necessita ver que o outro não serve e não presta para ele poder valer alguma coisa. É um fraco que teme aquele que não é igual e se sente ameaçado por ele. Além disso, ser preconceituoso é ser burro e tonto.

Hoje, há passeata para tudo. O psicanalista Contardo Calligaris escreveu que levar crianças a uma manifestação de rua parece perigoso. Mas não levar o filho é mais perigoso para o seu futuro e o seu espírito. Eles devem participar?
O omisso é cúmplice. Os pais que escondem do filho temas importantes estão furtando dele a completude na formação – e tendem a fazer da criança uma vítima de um sistema que pode ser maléfico. A família deve discutir temas sociais, sim. Se ela decide não ir à rua, deve explicar o porquê. Há pais que dizem: “Não me meto em política”. Ao agir assim, já se meteram. Isso é nocivo.

Quando símbolos fortes, que serviam de balizadores para a sociedade, se enfraquecem, aumenta a sensação de impotência. Exemplos: a Universidade de São Paulo (USP) vive uma crise financeira e científica e também moral, por ter abrigado o estupro de alunas por colegas sem que isso fosse apurado. A maior empresa pública, a Petrobras, está envolvida em escândalos e corrupção. Por que isso mina nossas forças?
Mexe com a gente porque são nossos símbolos de poder. Mas estão surgindo outros ícones, como comunidades que se conectam em blogs para cooperar; dentistas que se juntam para atender sem cobrar; instituições como Doutores da Alegria, que vão brincar com crianças em hospitais. Conheço desembargadores, em São Paulo, que saem do tribunal, colocam o nariz de palhaço e vão entreter doentes. São novos marcadores.

O que é preciso fazer para entender este momento da humanidade que vivemos?
Os chineses acham que devemos lidar com a história e não com o momento. Você só compreende o hoje se olha a história no seu desenvolvimento. É bom recordar o que falavam as avós: “Não há mal que sempre dure nem bem que nunca se acabe”. Portanto, nada de desespero. Problemas agudos se dissolvem no tempo. Os efeitos colaterais não são insuperáveis; podemos lidar com eles. É bom lembrar que devemos ter cuidado num mundo multifacetado, multicultural e multidiverso. Por isso, não podemos nos fechar em grupos exclusivos – só católicos, só gays, só muçulmanos -, o que leva à política do gueto e dilui a ideia de humanidade. Acabar com hinos nacionais também seria bom. Em geral, dizem: “Pega, esfola, estripa, arranca, mete a espada”. Temos de enxergar uma sociedade global e interconectada. Não pelo digital e pelo econômico somente, mas pela antropologia. Ou seja, pela convivência humana. E que cada um seja capaz de olhar o outro como o outro, não como o estranho. Homens e mulheres são diferentes, não desiguais. Brancos e negros são diferentes, mas devem ter os mesmos direitos.

O papa Francisco tem opinado em conflitos entre judeus e árabes, entre nações fortes e sociedades pobres, sempre na defesa da paz e da autonomia política dos povos. Repudia o terrorismo, mas critica o insulto à fé. Denuncia que o mundo é machista com as mulheres e prega respeito aos gays. Até provocou com a frase: “Sejamos revolucionários”. Muitos dizem que é o maior estadista do momento. Concorda?
Ele cumpre uma grande tarefa. Traz à tona questões difíceis. Não mexerá na doutrina, mas no campo da moral. Ele prega o acolhimento dos excluídos. Diz “Seja revolucionário” no limite que o cristianismo romano entende como revolução. A inspiração em Jesus ou São Francisco de Assis é boa para os jovens. O papa é uma expressão de alegria. Trata temas sérios de modo leve, não é carrancudo, não olha de cima. Assumiu o papel de defesa da paz onde há conflito. Ele me faz lembrar Benedito Spinoza, filósofo judeu que propõe a ética da alegria. É algo que precisa entrar na nossa rotina. Não quer dizer que a sociedade deva seguir no vício do hedonismo, buscar o prazer em tudo o que faz, seguir na lógica de que a vida é uma festa e não requer esforço. Isso degrada nossa capacidade, que deixa de construir algo um pouco mais forte.


Fonte: Geledés

segunda-feira, 14 de março de 2016

A História da Escravidão Negra no Brasil

A escravidão pode ser definida como o sistema de trabalho no qual o indivíduo (o escravo) é propriedade de outro, podendo ser vendido, doado, emprestado, alugado, hipotecado, confiscado. Legalmente, o escravo não tem direitos: não pode possuir ou doar bens e nem iniciar processos judiciais, mas pode ser castigado e punido.

Não existem registros precisos dos primeiros escravos negros que chegaram ao Brasil. A tese mais aceita é a de que em 1538, Jorge Lopes Bixorda, arrendatário de pau-brasil, teria traficado para a Bahia os primeiros escravos africanos.

Eles eram capturados nas terras onde viviam na África e trazidos à força para a América, em grandes navios, em condições miseráveis e desumanas. Muitos morriam durante a viagem através do oceano Atlântico, vítimas de doenças, de maus tratos e da fome.

Os escravos que sobreviviam à travessia, ao chegar ao Brasil, eram logo separados do seu grupo lingüístico e cultural africano e misturados com outros de tribos diversas para que não pudessem se comunicar. Seu papel de agora em diante seria servir de mão-de-obra para seus senhores, fazendo tudo o que lhes ordenassem, sob pena de castigos violentos. Além de terem sido trazidos de sua terra natal, de não terem nenhum direito, os escravos tinham que conviver com a violência e a humilhação em seu dia-a-dia.

A minoria branca, a classe dominante socialmente, justificava essa condição através de idéias religiosas e racistas que afirmavam a sua superioridade e os seus privilégios. As diferenças étnicas funcionavam como barreiras sociais.

O escravo tornou-se a mão-de-obra fundamental nas plantações de cana-de-açúcar, de tabaco e de algodão, nos engenhos, e mais tarde, nas vilas e cidades, nas minas e nas fazendas de gado.

Além de mão-de-obra, o escravo representava riqueza: era uma mercadoria, que, em caso de necessidade, podia ser vendida, alugada, doada e leiloada. O escravo era visto na sociedade colonial também como símbolo do poder e do prestígio dos senhores, cuja importância social era avalizada pelo número de escravos que possuíam.


A escravidão negra foi implantada durante o século XVII e se intensificou entre os anos de 1700 e 1822, sobretudo pelo grande crescimento do tráfico negreiro. O comércio de escravos entre a África e o Brasil tornou-se um negócio muito lucrativo. O apogeu do afluxo de escravos negros pode ser situado entre 1701 e 1810, quando 1.891.400 africanos foram desembarcados nos portos coloniais.

Nem mesmo com a independência política do Brasil, em 1822, e com a adoção das idéias liberais pelas classes dominantes o tráfico de escravos e a escravidão foram abalados. Neste momento, os senhores só pensavam em se libertar do domínio português que os impedia de expandir livremente seus negócios. Ainda era interessante para eles preservar as estruturas sociais, políticas e econômicas vigentes.

Ainda foram necessárias algumas décadas para que fossem tomadas medidas para reverter a situação dos escravos. Aliás, este será o assunto do próximo item. Por ora, vale lembrar que não eram todos os escravos que se submetiam passivamente à condição que lhe foi imposta. As fugas, as resistências e as revoltas sempre estiveram presentes durante o longo período da escravidão. Existiram centenas de “quilombos” dos mais variados tipos, tamanhos e durações. Os “quilombos” eram criados por escravos negros fugidos que procuraram reconstruir neles as tradicionais formas de associação política, social, cultural e de parentesco existentes na África.

O “quilombo” mais famoso pela sua duração e resistência, foi o de Palmares, estabelecido no interior do atual estado de Alagoas, na Serra da Barriga, sítio arqueológico tombado recentemente. Este “quilombo” se organizou em diferentes aldeias interligadas, sendo constituído por vários milhares de habitantes e possuindo forte organização político-militar.


Como era tratado o escravo

Antes de romper o sol, os negros eram despertados através das badaladas de um sino e formados em fila no terreiro para serem contados pelo feitor e seus ajudantes, que após a contagem rezavam uma oração que era repetida por todos os negros.

Após ingerirem um gole de cachaça e uma xícara de café como alimentação da manhã, os negros eram encaminhados pelo feitor para os penosos labor nas roças, e as oito horas da manhã o almoço era trazido por um dos camaradas do sitio em um grande balaio que continha a panela de feijão que era cozido com gordura e misturado com farinha de mandioca, o angu esparramado em largas folhas de bananeiras, abóbora moranga, couve rasgada e raramente um pedaço de carne de porco fresca ou salgada que era colocada no chão, onde os negros acocoravam-se para encher as suas cuias e iam comer em silêncio, após se saciarem os negros cortavam o fumo de rolo e preparavam sem pressa o seus cigarros feitos com palha de milho, e após o descanso de meia hora os negros continuavam a labuta até às duas horas quando vinha o jantar, e ao por do sol eram conduzidos de volta à fazenda onde todos eram passados em revista pelo feitor e recebiam um prato de canjica adoçada com rapadura como ceia e eram recolhidos a senzala.

E em suas jornadas diárias, os negros também sofriam os mais variados tipos de castigo (, nas cidades o principal castigo era os açoites que eram feitos publicamente nos pelourinhos que constituíam-se em colunas de pedras erguidas em praças pública e que continha na parte superior algumas pontas recurvadas de ferro onde se prendiam os infelizes escravos.

E cujas condenação à pena dos açoites eram anunciados pelos rufos dos tambores para uma grande multidão que se reunia para assistir ao látego do carrasco abater-se sobre o corpo do negro escravo condenado para delírio da multidão excitada que aplaudia, enquanto o chicote abria estrias de sangue no dorso nu do negro escravo que ficava à execração pública.

E um outro método de punição dado aos negros foi o castigo dos bolos que consistia em dar pancada com a palmatória nas palmas das mãos estendidas dos negros, e que provocavam violentas equimoses e ferimentos no apitélio delicado das mãos.

Em algumas fazendas e engenhos, as crueldades dos senhores de engenho e feitores atingiram a extremas e incríveis métodos de castigos ao empregarem no negro o anavalhamento do corpo seguido de salmoura, marcas de ferro em brasa, mutilações, estupros de negras escravas, castração, fraturas dos dentes a marteladas e uma longa e infinita teoria de sadismo requintado. No sul do Brasil, os senhores de engenhos costumavam mandar atar os punhos dos escravos e os penduravam em uma trava horizontal com a cabeça para baixo, e sobre os corpos inteiramente nus, eles untavam de mel ou salmoura para que os negros fossem picados por insetos.

E através de uma série de instrumentos de suplícios que desafiava a imaginação das consciências mais duras para a contenção do negro escravo que houvesse cometido qualquer falha, e no tronco que era um grande pedaço de madeira retangular aberta em duas metades com buracos maiores para a cabeça e menores para os pés e as mãos dos escravos, e para colocar-se o negro no tronco abriam-se as suas duas metades e se colocavam nos buracos o pescoço, os tornozelos ou os pulsos do escravo e se fechava as extremidades com um grande cadeado, o vira mundo era um instrumento de ferro de tamanho menor que o tronco, porém com o mesmo mecanismo e as mesmas finalidades de prender os pés e as mãos dos escravos, o cepo era um instrumento que consistia num grosso tronco de madeira que o escravo carregava à cabeça, preso por uma longa corrente a uma argola que trazia ao tornozelo.


O libanto era um instrumento que prendia o pescoço do escravo numa argola de ferro de onde saía uma haste longa.

Que poderia terminar com um chocalho em sua extremidade e que servia para dar o sinal quando o negro quando o negro andava, ou com as pontas retorcidas com a finalidade de prender-se aos galhos das árvores para dificultar a fuga do negro pelas matas, as gargalheiras eram colocadas no pescoço dos escravos e dela partiam uma corrente que prendiam os membros do negro ao corpo ou serviam para atrelar os escravos uns aos outros quando transportados dos mercados de escravos para as fazendas, e através das algemas, machos e peias os negros eram presos pelas mãos aos tornozelos o que impedia do escravo de correr ou andar depressa, com isto dificultava a fuga dos negros, e para os que furtavam e comiam cana ou rapadura escondido era utilizado a mascara, que era feita de folhas de flandes e tomava todo o rosto e possuía alguns orifícios para a respiração do negro, com isto o escravo não podia comer nem beber sem a permissão do feitor, os anjinhos eram um instrumento de suplicio que se prendiam os dedos polegares da vitima em dois anéis que eram comprimidos gradualmente para se obter à força a confissão do escravo incriminado por uma falta grave.

Já no início do século XIX era possível verificar grandes transformações que pouco a pouco modificavam a situação da colônia e o mundo a sua volta. Na Europa, a Revolução Industrial introduziu a máquina na produção e mudou as relações de trabalho. Formaram-se as grandes fábricas e os pequenos artesãos passaram a ser trabalhadores assalariados. Na colônia, a vida urbana ganhou espaço com a criação de estaleiros e de manufaturas de tecidos. A imigração em massa de portugueses para o Brasil foi outro fator novo no cenário do Brasil colonial.
Mesmo com todos esses avanços foi somente na metade do século que começaram a ser tomadas medidas efetivas para o fim do regime de escravidão. Vamos conhecer os fatores que contribuíram para a abolição:

1850 – promulgação da Lei Eusébio de Queirós, que acabou definitivamente com o tráfico negreiro intercontinental. Com isso, caiu a oferta de escravos, já que eles não podiam mais ser trazidos da África para o Brasil.

1865 – Cresciam as pressões internacionais sobre o Brasil, que era a única nação americana a manter a escravidão.

1871 – Promulgação da Lei Rio Branco, mais conhecida como Lei do Ventre Livre, que estabeleceu a liberdade para os filhos de escravas nascidos depois desta data. Os senhores passaram a enfrentar o problema do progressivo envelhecimento da população escrava, que não poderia mais ser renovada.

1872 – O Recenseamento Geral do Império, primeiro censo demográfico do Brasil, mostrou que os escravos, que um dia foram maioria, agora constituíam apenas 15% do total da população brasileira. O Brasil contou uma população de 9.930.478 pessoas, sendo 1.510.806 escravos e 8.419.672 homens livres.

1880 – O declínio da escravidão se acentuou nos anos 80, quando aumentou o número de alforrias (documentos que concediam a liberdade aos negros), ao lado das fugas em massa e das revoltas dos escravos, desorganizando a produção nas fazendas.

1885 – Assinatura da Lei Saraiva-Cotegipe ou, popularmente, a Lei dos Sexagenários, pela Princesa Isabel, tornando livres os escravos com mais de 60 anos.

1885-1888 – o movimento abolicionista ganhou grande impulso nas áreas cafeeiras, nas quais se concentravam quase dois terços da população escrava do Império.

13 de maio de 1888 – assinatura da Lei Áurea, pela Princesa Isabel.


No Brasil, o regime de escravidão vigorou desde os primeiros anos logo após o descobrimento até o dia 13 de maio de 1888, quando a princesa regente Isabel assinou, utilizando uma caneta de ouro e pedras preciosas, oferecida pelos abolicionistas, a Lei 3.353, mais conhecida como Lei Áurea, libertando os escravos.

A escravidão é um capítulo da História do Brasil. Embora ela tenha sido abolida há 115 anos, não pode ser apagada e suas conseqüências não podem ser ignoradas. A História nos permite conhecer o passado, compreender o presente e pode ajudar a planejar o futuro. Nós vamos contar um pouco dessa história para você. Vamos falar dos negros africanos trazidos para serem escravos no Brasil, quantos eram, como viviam, como era a sociedade da época. Mas, antes disso, confira o texto da Lei Áurea, que fez com que o dia 13 de maio entrasse para a História.
“Declara extinta a escravidão no Brasil. A princesa imperial regente em nome de Sua Majestade o imperador, o senhor D. Pedro II, faz saber a todos os súditos do Império que a Assembléia Geral decretou e ela sancionou a lei seguinte:

Art. 1°: É declarada extinta desde a data desta lei a escravidão no Brasil.
Art. 2°: Revogam-se as disposições em contrário.


Manda portanto a todas as autoridades a quem o conhecimento e execução da referida lei pertencer, que a cumpram e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nela se contém.

O secretário de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas e interino dos Negócios Estrangeiros, bacharel Rodrigo Augusto da Silva, do Conselho de sua majestade o imperador, o faça imprimir, publicar e correr.

Dado no Palácio do Rio de Janeiro, em 13 de maio de 1888, 67º da Independência e do Império.

Carta de lei, pela qual Vossa Alteza Imperial manda executar o decreto da Assembléia Geral, que houve por bem sancionar declarando extinta a escravidão no Brasil, como nela se declara.



Para Vossa Alteza Imperial ver“.

Em 13 de maio de 1888, a princesa Isabel aboliu a escravidão no Brasil, colocando nas ruas milhares de negros que, de uma hora para outra, ficaram sem destino. Com isso agradou a abolicionistas, bateu de frente com escravocratas e para muitos historiadores começou a escrever o epílogo do reinado de seu pai, Pedro II, que cairia pouco mais de um ano mais tarde. Até hoje aplaudida por muitos pelo fim e criticada por outros pelos meios utilizados e também pelos fins, a abolição da escravidão no País ainda é um assunto que encerra muitas discussões. Não houve, como nos Estados Unidos, uma guerra civil dividindo alas contrárias ao tema, não se disparou um tiro sequer para que os escravos ficassem livres ou continuassem presos a grilhões na senzala, mas também não houve uma discussão séria e definitiva sobre o caso. Claro, haviam os fóruns de debates, principalmente nas páginas dos jornais, nas quais brilhava a verve de José do Patrocínio. Mas muitos acreditam que a atitude de Isabel foi mais emocional do que prática. Afinal, não houve preparação suficiente para o fato, ricos senhores de terra que investiram muito em seus escravos ficaram, de uma hora para outra, sem eles e os governos pós-abolição não souberam utilizar o ato da princesa a favor de melhorias sociais.


Problemas da elite

Afinal, a escravidão dominou todos os aspectos da vida brasileira durante o século XIX. O final dessa instituição parecia ter aberto novas portas para uma sociedade mais justa e menos dividida. Mas a libertação dos escravos não podia deixar de ter conseqüências importantes e profundas para as finanças, tanto públicas quanto particulares. “Infelizmente, a irresponsabilidade financeira dos governos após a abolição transformou essa grande oportunidade para a reforma social em um desastre econômico. Esses políticos provocaram inflação, afugentaram investidores nacionais e estrangeiros e arrebentaram a onda de otimismo que se seguiu à emancipação”, explica Schulz. “Em um sentido mais amplo, os ajustes necessários à introdução do trabalho livre resultaram numa crise que durou quase três décadas”, diz o historiador.

Segundo ele, a crise financeira da abolição começou gradativamente. Vários anos poderiam, de acordo com Schulz, servir para o começo desse estudo: 1871, quando a Lei do Ventre Livre determinou que nenhum escravo nasceria no Brasil, ou 1880, quando começou a campanha abolicionista. “Ou, ainda, 1884, quando o Banco do Brasil parou de conceder hipotecas garantidas por escravos”, diz o autor, que escolhe o ano de 1875 como o primeiro a detonar o processo de crise financeira, quando o Brasil sofreu sua última crise como país escravagista. Essa tal crise, explica Schulz, teve como causa externa o início da “grande depressão” mundial do século XIX, e como causa interna a suspensão do Banco Mauá, o que levou muitos brasileiros à bancarrota, criando um sério problema para as elites, que a abolição só veio agravar.

“A crise financeira da abolição pode ser dividida em três partes: um mal-estar pré-abolição, uma ‘bolha’ chamada Encilhamento e um período de tentativas frustradas de estabilização que sucederam ao colapso da bolha”, diz Schulz, elencando outros problemas que advieram à abolição. “O ministério que realizou a abolição entendeu que seria necessário tomar providências financeiras para satisfazer aos fazendeiros e acabou sendo um dos gabinetes mais atuantes do século. A magnitude da mudança, porém, aos olhos dos fazendeiros, merecia medidas ainda mais enérgicas. Os três governos, um monarquista e dois republicanos, que se seguiram ao gabinete abolicionista, triplicaram a moeda em circulação, estimularam a especulação na bolsa de valores e tentaram de todas as maneiras conseguir o apoio dos grandes fazendeiros”, conta o historiador. “Essas ações irresponsáveis criaram uma bolha especulativa chamada de Encilhamento. Embora o estouro dessa bolha tenha sido bastante dramático, a crise continuou por uma década após o Encilhamento.” Ou seja: o que poderia e deveria ser uma alavancada para o progresso do País a partir da extirpação de um mal – a escravidão – acabou se tornando um mal maior ainda, devido à incompetência dos administradores do governo brasileiro. Qualquer economista recém-formado sabe que multiplicar o número da moeda circulante, apoiar a especulação na bolsa e não conter os gastos resultam em uma palavra que mais se assemelha a um dragão voraz: inflação.

A crise econômica que se seguiu à abolição, então, é muito bem trabalhada por Schulz em seu estudo, mostrando desde o problema do sistema financeiro internacional e a crise com os cafeicultores até as tentativas de estabilização da economia e a crescente inflação. Para ilustrar todas suas idéias e explicações, o autor ainda elenca uma série de tabelas, apresentando os gastos governamentais, a capitalização da Bolsa do Rio e o serviço da dívida brasileira. Para quem tem curiosidade sobre o assunto e deseja se aprofundar nesse tema que até hoje gera polêmica, o trabalho de Schulz publicado pela Edusp é um belo instrumento de apoio ao estudo. Talvez, inclusive, explique muita coisa que aconteceu até um passado muito recente e que está, de uma forma ou outra, apenas adormecida.


A longa permanência do negro no Brasil acabou por abrasileirá-lo.

De um lado, o africano se tornou ladino e tornou seus filhos crioulos e mestiços de várias espécies: mulato, pardo, cabra, caboclo. A crioulização e a mestiçagem são temas inevitáveis da história do negro no Brasil.

De outro lado, raros são os aspectos de nossa cultura que não trazem a marca da cultura africana. O assunto já foi muito tratado por historiadores e antropólogos, que estudaram dos negros, a família, a língua, a religião, a música, a dança, a culinária e a arte popular em geral.

Epopéia do negro no Brasil
1454: A bula Papal editada por Nicolau V dá aos portugueses a exclusividade para aprisionar negros para o reino e lá batizá-los.
1549: Tomé de Souza desembarca no Bahia. Com ele vieram provavelmente os primeiros escravos brasileiros.
1630: Data provável da formação do Quilombo dos Palmares. Palmares ocupou a maior área territorial de resistência política à escravidão. Ela foi uma das maiores lutas de resistência popular nas Américas.
1693: Morre a rainha Nznja, tuerreira, aujoiava
1695: Morte de Zumbi dos Palmares. Zumbi dirigiu Palmares num dos seus momentos mais dramáticos. As forças chefiadas pelo bandeirante Domingos Jorge velho destruíram o Quilombo e, depois, assassinaram Zumbi.
1741: Alvará determina que os escravos fugitivos serão marcados com ferro quente com a letra “F” carimbada nas espáduas.
1835: Levante de negros urbanos de Salvador. Segundo historiadores, a Revolta dos Malês foi a mais importante revolta urbana de negros brasileiros, pelo número de revoltosos, grau de organização e objetivos militares. Elas se inscrevem entre as grandes revoltas assistidas pela cidade no século 19: 1807, 1809, 1813, 1826, 1828,1830 e 1844.
1830: É enforcado o Oulomboja Manuel Gonga em Vassouras – RJ.
1833: ë fundado o Jornal “O Homem de cor” por Paula Brito, é o primeiro jornal brasileiro a lutar pelos direitos do negro.
1838: O governo do Sergipe proíbe que portadores de moléstias contagiosas e africanos, escravos ou não freqüentem escolas públicas.
1850: É editada a Lei Euzébio de Queiroz. Ela põe fim ao tráfico de escravos.. Nesse mesmo ano, é editada a lei da terra. A partir dessa lei era proibido ocupar terras no Brasil. Para possuir terra era necessário comprá-la do governo.
1854: Decreto proíbe o negro de aprender a ler e escrever.
1866: O império determina que os negros que serviam no exercito seriam alforriados.
1869: Proibidas a venda de escravos debaixo de pregão e com exposição pública. A lei proíbe a venda de casais separados e de pais e filhos.
1871: É editada a lei do ventre livre. Com ela os filhos de escravos seriam libertos, depois de completarem a maioridade.
1882: Morre o abolicionista Luiz Gama. Sua mãe, Luiza Mahin foi um das principais lideranças na Revolta dos Malês, em Salvador.
1883: Primeira libertação coletiva de escravos negros no Brasil.
1884: Abolição da escravatura negra na província do Amazonas.
1885: É editada a Lei do Sexagenário. A lei Saraiva-Cotegipe liberta os escravos com mais de 65 anos de idade. Segundo dados, a vida útil de um escravo era 15 anos, em média.
1886: O governo proíbe o açoite dos castigos aos escravos.
1888: Promulgada a Lei Áurea. ela extingue a escravidão no Brasil. O país é o último a abolir a escravidão do ocidente.
1890: Decreto sobre a imigração veta o ingresso no país de africanos e asiáticos. O ingresso de imigrantes europeus era liberada pelo governo.
1910: João Cândido, o Almirante negro, lidera a revolta da esquadra (Revolta das Chibatas) contra os castigos físicos praticados contra os marinheiros.
1914: Surge em Campinas a 1° organização sindical de negros. Dela participaram de forma expressiva e determinante as mulheres negras.
1915: Surge o Manelick, o primeiro jornal de negros da capital paulista.
1916: É criado o Centro Cívico Palmares, em São Paulo.
1929: Surge o jornal Quilombo, na cidade do Rio de Janeiro.
1931: Nasce a Frente Negra Brasileira (FNB) que chegou a reunir mais de 100 mil em diversos Estados do país. A organização pleiteava sua transformação em partido político. No ano de 1937, com a instalação do Estado Novo, a FNB é colocada na ilegalidade.
1932: É formado em São Paulo, o Clube do Negro de Cultura Social. Seus dirigentes editavam o jornal O Clarim da Alvorada, um dos mais importantes na história do periodismo racial.
1935: Surge, no Rio de Janeiro, O Movimento Brasileiro Contra o Preconceito Racial.
1936: Laudelina de Campos Mello funda na cidade de Santos a primeira Associação de Empregadas Domesticas no Brasil
1938: É organizada em São Paulo a União Nacional dos Homens de Cor
1944: Abdias Nascimento funda no Rio de Janeiro o Teatro Experimental do Negro.
1945: Renasce o Movimento Negro no país. Surge em São Paulo a Associação do Negro Brasileiro, fundada por ex- militantes da FNB. No Rio de Janeiro é organizado o Comitê Democrático Afro-Brasileiro com o objetivo de defender a constituinte, a anistia e o fim do preconceito racial e de cor. realiza-se a primeira Convenção Negro Brasileira com representantes do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio Grande do Sul e São Paulo, em São Paulo.
1948: Surgem as entidades, Frente Negra Trabalhista e Cruzada Social do Negro Brasileiro ( São Paulo); Turma Auriverde e Grêmio Literário Cruz e Souza (Minas Gerais) e União Cultural dos Homens de Cor (Rio de Janeiro).
1949: Realiza-se no Rio de Janeiro o Conselho Nacional de Mulheres Negras.
1950: No Rio é aprovada a Lei Afonso Arinos, que condena como contravenção penal a discriminação de raça, cor e religião, também é criado o conselho nacional de mulheres negras.
1954: É fundada em São Paulo a Associação Cultural do Negro.
1969: O governo do general Emílio G. Médici proíbe a publicação de noticias sobre movimento negro e a discriminação racial.
1971: Surge em Porto Alegre o Grupo Palmares.
1974: Morre o poeta Solano “Vento Forte Africano” Trindade. É fundado em Salvador o bloco afro Ilé – Aiê.
1975: No Congresso das Mulheres Brasileiras, realizado no Rio de Janeiro, mulheres negras denunciam as discriminações racial e sexual a que estão submetidas. Realiza-se em São Paulo a Semana do Negro na Arte e na Cultura. O movimento articula apoio às lutas de libertação nacional travadas no continente africano. Surgem várias entidades de combate ao racismo. Em São Paulo surgem o Centro de Estudos da Cultura e da Arte Negra (Cecan), a Associação cristã Beneficente, Movimento Teatral Cultural Negro, Grupo de Teatro Evolução, Associação Cultural e Recreativa Brasil Jovem, Instituto Brasileiro de Estudos Africanistas (IBEA), Federação das Entidades Afro-brasileiras do Estado de São Paulo. No Rio de Janeiro surgem Grupo Latino- Americano, Instituto de Pesquisas da Cultura Negra (IPCN), Escola de Samba Gran Quilombo, Sociedade de Intercâmbio Brasil-África.
1976: O governo da Bahia suprime a exigência de registro policial para os templos de ritos afro-brasileiros.
1977: É assassinado Robson S. Luz. Quatro jovens atletas são discriminados no Clube Regatas Tietê. Nos rastros dessas denuncias surge o Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial, mais tarde, Movimento Negro Unificado (MNU). Na assembléia nacional do MNU é aprovada a comemoração do Dia Nacional de Consciência Negra, em 20 de novembro em celebração a memória do herói negro Zumbi dos Palmares. Surge o Movimento de Mulheres Negras.
1978:Consolidação do MNU Movimento Negro Unificado – São Paulo, É declarado pelo MNU o dia 20 de novembro o dia da consciência negra.
1979: O quesito cor é incluído no recenseamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) por pressão de sociólogos e pesquisadores e segmentos da sociedade.
1982: Morre em Salvador Mestre Pastinha, é também tombado o primeiro terreiro de candomblé do Brasil; o terreiro da Casa Branca ile axê, ia nasso oka Bahia
1986: Tombamento da serra da Barrija local onde se desenvolveu o quilombo dos palmares, a gaúcha Deise Nunes de Souza é coroada Miss Brasil é a primeira Miss Brasil negra.
1987: Fundado o instituto do negro em São Paulo.
1989: Nasce no mês de novembro o jornal Umbandomblé que passou a ser Umbanda & Candomblé, Ciência, Cultura e Magia e hoje conhecido por U&C, Ciência, Cultura e Magia.
1990: É inaugurado no município de Volta redonda – RJ o memorial zumbi dos palmares.



A Cultura Afro-Brasileira

A inserção da população negra na sociedade brasileira se deu pelo trabalho, base da organização econômica e da convivência familiar, social e cultural. A miscigenação avança, com um número cada vez maior de mulatos. Nasce uma religiosidade popular em torno das irmandades católicas e dos terreiros de umbanda e candomblé. Em 1800, cerca de dois terços da população do país – 3 milhões de habitantes – eram formados por negros e mulatos, cativos ou libertos.

A cultura afro-brasileira é uma das que mais se destacam no cenário do sincretismo religioso no Brasil.

A música e a dança dos descendentes africanos são exemplos vivos do que é o patrimônio cultural do continente negro amadurecido ao longo do milênio. Uma história antiga e valiosa pode ser contada através da música, da dança, do teatro, do artesanato, da indumentária e das tradições.



Candomblé

O Candomblé se difundiu no Brasil no século passado com a migração de africanos como escravos para os senhores de terra. A população escrava no Brasil consistia quase totalmente de negros de Angola. No momento da chegada dos nagôs, um século e meio de escravidão havia passado, distribalizando o negro e apagando seus costumes, crenças e sua língua nacional. Mas o elemento africano, resistiu e criou uma forma de cultuar seus deuses através do sincretismo com os santos católicos.

Mesmo levando em conta a pressão social e religiosa, era relativamente fácil para os escravos, na sonolência geral, reinstalar na Bahia as crenças e práticas religiosas que trouxera da África, pois, a igreja católica estava cansada do esforço despendido na criação de irmandades de negros como tentativa de anular toda sua cultura, mas todos os meses novas levas de escravos, adeptos ao culto aos Orixás, desembarcavam na Bahia.

Por volta de 1830 três negras conseguiram fundar o primeiro templo de sua religião na Bahia, conhecida como Ylê Yá Nassó, casa da mãe Nassó. (Nassó seria o título de princesa de uma cidade natal da costa da África). Esta seria a primeira a resistir às opressões católicas, desta casa se originam mais três que sobrevivem até hoje e que fazem parte do grande CANDOMBLÉ DA BAHIA, sendo elas: O Engenho velho ou Casa Branca, Gantóis, cuja ilustre dirigente foi mãe menininha do Gantóis (falecida em 1986) e do Araketu.

Os Candomblés se diversificaram desde 1830, a medida que a religião dos nagôs se firmava, primeiro entre os escravos e for fim, no seio do povo. Hoje há quatro tipos de Candomblé ou Candomblé de quatro nações: Kêtu (povo nagô), Jêje (povo nagô, mas obedientes a uma outra cultura), Angola-congo (povo bantu, este culto é mais brasileirado) e de caboclo (cultuam mais os caboclos, mistura-se com a umbanda).

O Candomblé baseia-se no culto aos Orixás, deuses oriundas das quatro forças da natureza: Terra, Fogo, Água e Ar. Os Orixás são, portanto, forças energéticas, desprovidas de um corpo material. Sua manifestação básica para os seres humanos se dá por meio da incorporação. O ser escolhido pelo orixá, um dos seus descendentes, é chamado de elegum, aquele que tem o privilégio de ser montado por ele. Torna-se o veículo que permite ao orixá voltar à Terra para saudar e receber as provas de respeito de seus descendentes que o evocaram. Cada orixá tem as suas cores, que vibram em seu elemento visto que são energias da natureza, seus animais, suas comidas, seus toques (cânticos), suas saudações, suas insígnias, as suas preferências e suas antipatias, e aí daquele que devendo obediência os irrita.

A síntese de todo o processo seria a busca de um equilíbrio energético entre os seres materiais habitantes da Terra e a energia dos seres que habitam o orum, o suprareal (que tanto poderia localizar-se no céu – como na tradição cristã – como no interior da Terra, ou ainda numa dimensão estranha a essas duas, de acordo com diferentes visões apresentadas por nações e tribos diferentes). Cada ser humano teria um orixá protetor, ao entrar em contato com ele por intermédio dos rituais, estaria cumprindo uma série de obrigações. Em troca, obteria um maior poder sobre suas próprias reservas energéticas, dessa forma teria mais equilíbrio.

Cada pessoa tem dois Orixás. Um deles mantém o status de principal, é chamado de orixá de cabeça, que faz seu filho revelar suas próprias características de maneira marcada. O segundo orixá, ou ajuntó, apesar de distinção hierárquica, tem uma revelação de poder muito forte e marca seu filho, mas de maneira mais sutil. Um seria a personalidade mais visível exteriormente, assim como o corpo de cada pessoa, enquanto o outro seria a face oculta de sua personalidade, menos visível aos que conhecem a pessoa superficialmente, e às potencialidades físicas menos aparentes.

Como qualquer outra religião do mundo, o Candomblé possui cerimoniais específicos para seus adeptos. no seu caso particular, porém, esses ritos mostram singularidades especialíssimas, como a leitura de búzios (um primeiro e ocular contato com os Orixás), a preparação e entrega de alimentos para cada uma das entidades ou as complexas e prolongadas iniciações dos filhos-de-santo. Através da observância desses procedimentos é que o Candomblé religa os humanos aos seres astrais, proporcionando àqueles o equilíbrio desejado na existência.

O candomblé e demais religiões afro-brasileiras tradicionais formaram-se em diferentes áreas do Brasil com diferentes ritos e nomes locais derivados de tradições africanas diversas: candomblé na Bahia, xangô em Pernambuco e Alagoas, tambor de mina no Maranhão e Pará, batuque no Rio Grande do Sul e macumba no Rio de Janeiro.

A organização das religiões negras no Brasil deu-se bastante recentemente, no curso do século XIX. Uma vez que as últimas levas de africanos trazidos para o Novo Mundo durante o período final da escravidão (últimas décadas do século XIX) foram fixadas sobretudo nas cidades e em ocupações urbanas, os africanos desse período puderam viver no Brasil em maior contato uns com os outros, físico e socialmente, com maior mobilidade e, de certo modo, liberdade de movimentos, num processo de interação que não conheceram antes. Este fato propiciou condições sociais favoráveis para a sobrevivência de algumas religiões africanas, com a formação de grupos de culto organizados.

Até o final do século passado, tais religiões estavam consolidadas, mas continuavam a ser religiões étnicas dos grupos negros descendentes dos escravos. No início deste século, no Rio de janeiro, o contato do candomblé com o espiritismo kardecista trazido da França no final do século propiciou o surgimento de uma outra religião afro-brasileira: a umbanda, que tem sido reiteradamente identificada como sendo a religião brasileira por excelência, pois, nascida no Brasil, ela resulta do encontro de tradições africanas, espíritas e católicas.

Desde o início as religiões afro-brasileiras formaram-se em sincretismo com o catolicismo, e em grau menor com religiões indígenas. O culto católico aos santos, numa dimensão popular politeísta, ajustou-se como uma luva ao culto dos panteões africanos. A partir de 1930, a umbanda espraiou-se por todas a regiões do País, sem limites de classe, raça, cor, de modo que todo o País passou a conhecer, pelo menos de nome, divindades como Iemanjá, Ogum, Oxalá etc.

O candomblé, que até 20 ou 30 anos atrás era religião confinada sobretudo na Bahia e Pernambuco e outros locais em que se formara, caracterizando-se ainda uma religião exclusiva dos grupos negros descendentes de escravos, começou a mudar nos anos 60 e a partir de então a se espalhar por todos os lugares, como acontecera antes com a umbanda, oferecendo-se então como religião também voltada para segmentos da população de origem não-africana. Assim o candomblé deixou de ser uma religião exclusiva do segmento negro, passando a ser uma religião para todos. Neste período a umbanda já começara a se propagar também para fora do Brasil.

Durante os anos 1960, com a larga migração do Nordeste em busca das grandes cidades industrializadas no Sudeste, o candomblé começou a penetrar o bem estabelecido território da umbanda, e velhos umbandistas começaram e se iniciar no candomblé, muitos deles abandonando os ritos da umbanda para se estabelecer como pais e mães-de-santo das modalidades mais tradicionais de culto aos orixás. Neste movimento, a umbanda é remetida de novo ao candomblé, sua velha e “verdadeira” raiz original, considerada pelos novos seguidores como sendo mais misteriosa, mais forte, mais poderosa que sua moderna e embranquecida descendente, a umbanda.

Nesse período da história brasileira, as velhas tradições até então preservadas na Bahia e outros pontos do País encontraram excelentes condições econômicas para se reproduzirem e se multiplicarem mais ao sul; o alto custo dos ritos deixou de ser um constrangimento que as pudesse conter. E mais, nesse período, importantes movimentos de classe média buscavam por aquilo que poderia ser tomado como as raízes originais da cultura brasileira. Intelectuais, poetas, estudantes, escritores e artistas participaram desta empreitada, que tantas vezes foi bater à porta das velhas casas de candomblé da Bahia. Ir a Salvador para se ter o destino lido nos búzios pelas mães-de-santo tornou-se um must para muitos, uma necessidade que preenchia o vazio aberto por um estilo de vida moderno e secularizado tão enfaticamente constituído com as mudanças sociais que demarcavam o jeito de viver nas cidades industrializadas do Sudeste, estilo de vida já, quem sabe?, eivado de tantas desilusões.

O candomblé encontrou condições sociais, econômicas e culturais muito favoráveis para o seu renascimento num novo território, em que a presença de instituições de origem negra até então pouco contavam. Nos novos terreiros de orixás que foram se criando então, entretanto, podiam ser encontrados pobres de todas as origens étnicas e raciais. Eles se interessaram pelo candomblé. E os terreiros cresceram às centenas.

O termo candomblé designe vários ritos com diferentes ênfases culturais, aos quais os seguidores dão o nome de “nações” (Lima, 1984). Basicamente, as culturas africanas que foram as principais fontes culturais para as atuais “nações” de candomblé vieram da área cultural banto (onde hoje estão os países da Angola, Congo, Gabão, Zaire e Moçambique) e da região sudanesa do Golfo da Guiné, que contribuiu com os iorubás e os ewê-fons, circunscritos principalmente aos atuais território da Nigéria e Benin. Mas estas origens na verdade se interpenetram tanto no Brasil como na origem africana. 


A arte da Capoeira

Pouco pode se afirmar a cerca da origem da capoeira, devido à falta de documentação. Porém, através da tradição oral e de raros registros, sabe-se que foram os africanos escravizados, aqui no Brasil, que desenvolveram essa arte.

Os negros aprisionados na África e trazidos para o Brasil eram de várias nações e regiões daquele continente, e cada um desses grupos possuía sua própria cultura como, danças, músicas, lutas, religiões, seus rituais etc; aqui chegando já na condição de escravos houve uma grande mistura dos membros desses grupos, e na convivência entre si eles foram absorvendo partes dos conhecimentos de outros.

Neste ponto teria surgido a capoeira, mistura da arte de vários povos africanos e seus descendentes, mas em solo brasileiro. Outra teoria muito popular e acreditamos que muito de nós aprendemos na escola, que a Capoeira seria uma luta onde os escravos disfarçavam em forma de dança para poderem praticá-la sem problemas, e assim estariam preparados para futuras fugas.
Mas essa história tem algo de errado, pois por volta de 1841, após a chegada de Dom João VI, que fugiu para o Brasil por razão da invasão das tropas de Napoleão Bonaparte em Portugal.
As manifestações culturais negras como a música e a dança foram muito perseguidas e até proibidas pelos nobres e senhores de escravos, sendo assim, como poderia a capoeira ser disfarçada em dança?

Outra afirmação diz que a Capoeira é de origem Africana, pois existe um ritual praticado pelos jovens guerreiros Mucupes, do sul de Angola, durante a Efundula (quando as meninas passam a condição de mulher), realizavam a dança das zebras com o nome de N’golo. O guerreiro que mais se destacasse poderia escolher sua noiva sem precisar pagar o dote ao pai dela.

Mas esta afirmação também merece reservas, pois para muitos historiadores este ritual seria apenas mais um absorvido e misturado pelos negros escravos na nossas colonização.

Existem ainda várias outras histórias e lendas sobre a origem da Capoeira, mas nenhuma delas tem a documentação necessária para sua confirmação, pois depois do golpe militar conhecido como Proclamação da República no governo de Deodoro da Fonseca, todos os documentos referentes a escravidão no Brasil foram destruídos com a desculpa dos republicanos de que queriam apagar essa vergonha da história do Brasil.

Mas a verdade é que eles assumiram o governo logo após a abolição, e caberia ao novo governo as indenizações necessárias aos donos de escravos, e sem as provas documentais, isto seria quase impossível.

Em 11 de outubro de 1890, foi promulgada a Lei n. 487, de autoria de Sampaio Ferraz, que proibia a prática da capoeira e previa punição de 2 a 6 meses de trabalho forçado na Ilha de Fernando de Noronha.

No art. 402, que tratava “Dos vadios capoeira”, lia-se: “Fazer nas ruas e praças públicas exercícios de agilidade e destreza corporal conhecidos pela denominação capoeiragem; andar em correria, com armas ou instrumentos capazes de produzir uma lesão corporal, provocando tumulto ou desordem, ameaçando pessoa certa ou incerta, ou incutindo temor de algum mal.


Pena – prisão celular de dois a seis meses.

Parágrafo único – é considerada circunstância agravante pertencer o capoeira a algum bando ou malta. Aos chefes e cabeças se imporá a pena em dobro.”

Curioso foi que, como não eram apenas os negros e populares que praticavam a capoeira, a lei acabou atingindo importantes pessoas da nobreza. Exemplo disso foi o conhecido caso de José Elísio dos Reis. Seu pai era o Conde de Matosinhos e proprietário do jornal O País.

Conhecido de todos como praticante da Capoeira, Juca Reis, antes da aprovação da lei, estava em Portugal. Quando retornou ao Brasil, foi preso por Sampaio Ferraz. A sua liberdade foi conseguida graças à influência de Quintino Bocaiúva. Este ameaçou renunciar ao seu cargo de ministro das Relações Exteriores caso Juca Reis não fosse liberto.

Quintino foi ouvido por Marechal Deodoro e o “nobre” capoeira voltou para Portugal.

Os capoeiras continuaram perseguidos por todo o século XIX.


Além da elite, que deles tinha verdadeiro pânico, a população também apoiava a ação dos policiais. O texto publicado no jornal Diário de Notícias, a 19 de janeiro de 1890, exemplifica:

“É polícia das primeiras
É levadinha do diabo
Deu cabo dos capoeiras
Vai dos gatunos dar cabo
Já da navalha afiada
A ninguém o medo aperta
Vai poder a burguesada
Ressonar com a porta aberta
A ir assim poderemos
Andar mui sossegadinhos
Nessa terra viveremos
Como Deus com seus anjinhos
Ai! Assim continuando,
A polícia hemos de ver
As suas portas fechando
Por não ter mais que fazer.”




Culinária afro-brasileira

O negro introduziu na cozinha o leite de coco-da-baía, o azeite de dendê, confirmou a excelência da pimenta malagueta sobre a do reino, deu ao Brasil o feijão preto, o quiabo, ensinou a fazer vatapá, caruru, mungunzá, acarajé, angu e pamonha.

A cozinha negra, pequena mas forte, fez valer os seus temperos, os verdes, a sua maneira de cozinhar. Modificou os pratos portugueses, substituindo ingredientes; fez a mesma coisa com os pratos da terra; e finalmente criou a cozinha brasileira, descobrindo o chuchu com camarão, ensinando a fazer pratos com camarão seco e a usar as panelas de barro e a colher de pau.


Milagre para o governador tomar sopa

O primeiro negro pisou no Brasil com a armada de Martin Afonso. Negros e mulatos (da Guiné e do Cabo Verde) chegaram aqui em 1549, com o Governador Tomé de Souza, que comia mal e era preconceituoso: entre outras coisas, não admitia sopa de cabeça de peixe, em honra a São João Batista.

Bem que o Padre Nóbrega tentou convencê-lo de que era bobagem, mas Tomé de Souza resistiu, até que o jesuíta mandou deitar a rede ao mar e ela veio só cabeça de peixe, bem fresca e o homem deixou a mania, entrou na sopa.

Da guiné vieram, principalmente, fulas e mandingas, islamitas e gente de bem comer. Os fulas eram de cor opaca, o que resultou no termo “negro fulo” (entrando depois na língua a expressão “fulo de raiva”, para indicar a palidez até do branco). Os mandingas também entraram na língua como novo sinônimo para encantamentos e artes mágicas. Mas os iorubanos ou nagôs, os jejes, os tapas e os haussás, todos sudaneses islamitas e da costa oeste também, fizeram mais pela nossa cozinha porque eram mais aceitos como domésticos do que a gente do sul, o povo de Angola, a maioria de língua banto, ou do que os negros cambindas do Congo, ou os minas, ou os do Moçambique, gente mais forte, mais submissa e mais aproveitada para o serviço pesado.

O africano contribuiu com a difusão do inhame, da cana de açúcar e do dendezeiro, do qual se faz o azeite-de-dendê. O leite de coco, de origem polinésia, foi trazido pelos negros, assim como a pimenta malagueta e a galinha de Angola

Abará
Bolinho de origem afro-brasileira feito com massa de feijão-fradinho temperada com pimenta, sal, cebola e azeite-de-dendê, algumas vezes com camarão seco, inteiro ou moído e misturado à massa, que é embrulhada em folha de bananeira e cozida em água. (No candomblé, é comida-de-santo, oferecida a Iansã, Obá e Ibeji).


Aberém
Bolinho de origem afro-brasileira, feito de milho ou de arroz moído na pedra, macerado em água, salgado e cozido em folhas de bananeira secas. (No candomblé, é comida-de-santo, oferecida a Omulu e Oxumaré).


Abrazô
Bolinho da culinária afro-brasileira, feito de farinha de milho ou de mandioca, apimentado, frito em azeite-de-dendê.


Acaçá
Bolinho da culinária afro-brasileira, feito de milho macerado em água fria e depois moído, cozido e envolvido, ainda morno, em folhas verdes de bananeira. (Acompanha o vatapá ou caruru. Preparado com leite de coco e açúcar, é chamada acaçá de leite.) [No candomblé, é comida-de-santo, oferecida a Oxalá, Nanã, Ibeji, Iemanjá e Exu.


Ado
Doce de origem afro-brasileira feito de milho torrado e moído, misturado com azeite-de-dendê e mel. (No candomblé, é comida-de-santo, oferecida a Oxum).


Aluá
Bebida refrigerante feita de milho, de arroz ou de casca de abacaxi fermentados com açúcar ou rapadura, usada tradicionalmente como oferenda aos orixás nas festas populares de origem africana.


Quibebe
Prato típico do Nordeste, de origem africana, feito de carne-de-sol ou com charque, refogado e cozido com abóbora.
Tem a consistência de uma papa grossa e pode ser temperado com azeite-de-dendê e cheiro verde.



Música e Dança

Na África, ser músico é quase como ser padre, pois a música está ligada às tradições religiosas. E aquele que nasce em uma família de músicos deve seguir o ofício até o fim da vida. Nenhum ritual importante na religiosidade africana é praticado sem música. Canta-se e toca-se para tudo e para todos os santos. No Brasil, o candomblé exerceu forte influência na música de todo o país e é conhecido nas diversas regiões por nomes diferentes. No Maranhão, o culto é conhecido como tambor de mina. Do Rio Grande do Norte até Sergipe, o candomblé recebe o nome de xangô. Já no Rio Grande do Sul, o nome corrente é simplesmente batuque.

Séculos de miscigenação com mulçumanos do norte da África justificam a enorme permissividade de Portugal com relação a determinadas práticas musicais e religiosas: os batuques. Nos Estados Unidos, por exemplo, os negros nunca puderam tocar seus tambores.

No candomblé usam-se três tambores de timbres diferentes e um agogô, instrumento de ferro que repercute como um sino, para acompanhar as cantigas levadas pelos pais e mães-de-santo na condução das cerimônias religiosas. Ainda hoje a língua dos cânticos preserva palavras da língua original.

Batuque é a denominação genérica para as danças dos negros africanos. Carimbó, tambor de criola, bambelô, zambê, candomblé, samba de roda, jongo, caxambu são alguns dos batuques ainda praticados em todo o Brasil, principalmente nas ocasiões em que os negros se reúnem para festejar ou lembrar a escravidão. A palavra “batuque” aparece nos relatos mais antigos da nossa história. No entanto, não se sabe se ela se refere a uma dança de sapateados e palmas ou a um ritual religioso. Sabe-se, porém, que os senhores tinham total desprezo pelas práticas culturais africanas por considerá-las obscenas. A umbigada, gesto em que os ventres do homem e da mulher se encontram no ponto culminante da música, era uma das danças desprezadas pelos senhores de engenho.

Samba – O samba verdadeiro era de lamento, pois era assim que o negro lamentava a sua vida. O samba é uma dança animada com um ritmo forte e característico. Originou da África e foi levado para a Bahia pelos escravos enviados para trabalhar nas plantações de açúcar. A dança gradualmente perdeu sua natureza ritualista e eventualmente se tornou a dança nacional brasileira. Na época de carnaval no Rio de Janeiro que colocou o samba no mapa ocidental, os baianos das plantações de açúcar viajavam das aldeias até o Rio para as festas anuais. Gradualmente a batida sutil e a nuança interpretativa do samba levavam-nos rua acima dançando nos cafés e eventualmente até nos salões de baile, tornou-se a alma dança do Brasil. Originalmente a dança teve movimentos de mão muito característico, derivados de sua função ritualista, quando eram segurados pequenos recipientes de ervas aromáticas em cada uma das mãos e eram aproximadas do nariz do dançarino cuja fragrância excitava. Havia muito trabalho de solo e antes de se tornar uma dança de salão, teve passos incorporados do maxixe. Os grandes dançarinos americanos, Irene e Castelo de Vernou, usou o samba nas suas rotinas profissionais, e assim começou a se espalhar. Mas provavelmente foi Carmem Miranda, a brasileira mais conhecida de todos, que com tremenda vitalidade e perícia de atriz, colocou o samba como o mais excitante e contagiante do mundo. No Brasil o desfile das escolas de samba, cresceu e o País desenvolveu seu próprio ballet artístico com ritmo de samba e movimentos básicos.